março 26, 2007

Melinda

Melinda me deixava louco desde o segundo grau. Não me entenda mal, não estou falando de paudurecência e o caralho, nada disso. Não, não, o negócio não era carnal, tão pouco platônico. Pra falar bem a verdade, Melinda era a mulher mais sem graça de toda a turma, provavelmente a mais sem graça de todo o universo das turmas do segundo grau do universo conhecido. Não que ela fosse feia, mas bonita ela com certeza não era. Pra dizer a verdade era quase feia ou quase bonita como um copo pela metade em que não conseguimos decidir se está meio cheio ou vazio. Ela era pequena, bem magrinha, cabelo escorrido e cortado meio reto, a cor eu não conseguia decidir se era meio claro ou meio escuro, praticamente sem peito nenhum, pernas finas, andava com umas roupas bem discretas, algo como uma blusinha e calça jeans, tudo liso, discreto. Melinda era como eu aprendi que a água deveria ser (até inventarem o refrigerante e essas águas de veado com leve sabor):

Insípida, inodora, incolor.

Acho que tinha um outro adjetivo para a água das aulas de Ciências da 5a série, mas agora não me ocorre. Líquida talvez? Não, não, bom, deixamos disso e vamos dar prosseguimento a coisa.

Aí você vai dizer, porra, mas como que tu nota tanto uma menina tão sem sal? Aí que está, cumpadi, eu não notava. Porém, um dia tudo isso mudou.

Não sei desde que época estudávamos na mesma sala, o caso é que eu nunca a notara antes. Talvez eu que seja ruim de memória, mas meu colégio não era grande, de modo que com certeza eu já deveria tê-la visto, mas o caso é que não me lembro jamais de ter notado Melinda, nem mesmo com esse nome não tão usual, até que percebi ela sentada na classe logo a minha frente.

Aquilo intrigou-me pouco, é verdade, mas estávamos no meio do ano e era a primeira vez que eu via aquela guria sentada a minha frente. Comecei a notá-la cada vez mais em todas as aulas. E, como que mágica, ela sempre sentava a minha frente. Não importa o lugar que ela escolhesse ou que eu escolhesse, Melinda estava sempre lá, com aqueles cabelos retos, lisos e escorridos, nem pretos, nem loiros, à minha frente. E note bem que isso não era algum tipo de implicância ou charminho, pois muitas vezes entrávamos na sala antes do sinal, deixávamos nossas coisas embaixo da classe e só então retornávamos a sala - só para descobrir que lá estava ela de novo, sentada no lugar logo na frente de mim.

Mas não era só na classe que ela ficava na minha frente. Em todas as provas ela tirava uma nota um ou dois décimos acima da minha. No bar, quando ia comprar alguma coisa no intervalo, lá estava ela. Quando ia matar aula e jogar sinuca no bar perto do colégio, ela e suas amigas já estavam ocupando a mesa. E quando nos formamos (eu sei, formaturas de segundo grau não deveriam existir) adivinha se o nome dela não era antes do meu? Melinda estava sempre à minha frente. Mesmo depois do colégio, vivia encontrando ela em todas as festas, sempre à minha frente.

Quando fui viajar para Londres, nunca tinha saído do país e queria ver qual é, você sabe como é, intercâmbio e essa coisa toda. Fiz o check-in e embarquei no avião. Como minha poltrona era bem no fundo, tive que ir esperando as pessoas que acomodavam suas bagagens de mão no compartimento para bagagens de mão se sentarem para desocupar o corredor. Quando finalmente me aproximei do meu lugar, uma última pessoa ainda me impedia de chagar lá.

Era Melinda.

Logo à frente da minha poltrona.

Aquilo me deixou maluco. Era mais que improvável. Era totalmente impossível. Não pude evitar e começar a trocar um papo gigantesco com ela. Ela me disse que já tinha estado em Londres anteriormente e que desta vez queria ficar um pouco mais. Acabamos descobrindo que estávamos com reservas para o mesmo hotel, o meu quarto no 4o andar, o dela no 5o, bem acima do meu. Papo vai, papo vem, ela me mostrou o que conhecia de Londres e aquele sentimento maluco de se estar longe da terra natal e dos entes queridos nos aproximou de modo que não conseguimos evitar de transar uma hora ou outra.

Na nossa primeira noite sem roupas, logo depois de umas 5 ou 6 trepadas, eu descobri que o destino estava me dizendo, durante todo aquele tempo em que ela estivera sempre à minha frente, que eu fui feito para ficar bem atrás dela.

- Deus, como ela sabe mexer aquela bunda!