fevereiro 03, 2006

O apocalipse segundo o evangelho de Billy Boy Thorbey

Capítulo 1 (e único)

Só há um livro que falou seriamente sobre o apocalipse, este livro é o evangelho de Billy Boy Thorbey, que descrevia com minúcias aqueles estranhos tempos onde não mais os humanos iriam destruir tudo, mas sim quatro sujeitos muito loucos, que iam chegar barbarizando em seus cavalos e roupas descoladas para dar um fim na zorra que se transformou o planeta Terra - pra começar por esse tenebroso nome. Terra? Come on. Todos sabem que o nome divino para o azulado círculo oval é Metazubro XXXXII (não cabe aqui revelar o por quê da alta numeração, mas Zebediah Noirton sabia).

Ah, Zebediah Norton era um sujeito simpático que trabalhava numa lanchonete e que não tinha muito o que fazer, pois sua lanchonete ficava numa pequena cidade de interior chamada Canoon, onde todos os habitantes tinham o estranho hábito de fazerem todas suas refeições em casa, o que deixava a lanchonete onde Zebediah Noirton trabalhava bastante deserta. Mas ele não se abalava por isso, muito pelo contrário, cada vez que algum viajante ou coisa assim cruzava a cidade e desembocava na lanchonete, Zebediah se puxava para oferecer o melhor atendimento possível - afinal, a gorjeta era rara e a oportunidade de recebê-la mais ainda.

Por ter muito, mas muito mesmo, tempo livre entre um cliente e outro, Zebediah certa vez, após lavar e secar todos os pratos duas vezes, pegou seu caderninho de anotação de pedidos e começou a rabiscar frases soltas, que acabaram por coincidência formando parágrafos e, por mais incrível que possa parecer, no fim, juntando tudo de trás pra frente e lendo suas páginas refletidas num espelho, Zebediah percebeu que havia escrevido o livro definitivo sobre o apocalipse, estava descrito tudo como ia acontecer do início ao fim, tinha até um parágrafo que falava com minúcia a argúcia necessária para interromper o efeito cascata apocalíptico, que resultaria na salvação de Matazubro XXXXII (a popular e populosa Terra). Zebediah deu a este livro o nome de Evangelho de Billy Boy Thorbey.

Até hoje ninguém sabe o motivo disso, até porque ninguém realmente considerou a hipótese de refletir sobre uma bobagem dessas, mas, se tivessem gastado algum fosfato na pergunta e refletissem seriamente sobre o nome do livro definitivo, a resposta seria bastante óbvia:

- Não faço idéia.

Afora denominações bobas que concernem o título da obra, o mais importante é que o livro realmente descrevia como evitar o apocalipse de uma forma bastante simples, pra falar a verdade era muito simples, bastava que uma virgem transasse com um camelo.

Apenas uma virgem e um camelo.

Por quê?

Mais uma dessas coisas que só podem ser consideradas como piada divina. Todos sabem que Deus, além de não jogar dados (na verdade Ele joga pôquer, só que sempre rouba, o desgraçado - quer dizer, O Desgraçado), tem um senso de humor tremendo, a prova disso esta por toda parte: a maior religião do mundo é baseada em um deus enfurecido que joga dilúvios sobre as pessoas porque elas estão chineleando como se não houvesse amanhã, depois engravida uma virgem e manda um outro sujeito casar com ela, este desvirginamento divino acaba resultando em um filho, que some durante 30 anos, e volta com a maior pinta de hippie dizendo coisas legais como “vamos ser legais uns com os outros” - e o pobre guri acaba pregado numa cruz por isso, aparentemente, para aplacar a fúria do Senhor Seu Pai, que aliviou o dilúvio parte 2 em cima do lombo do geral por causa disso.

Ok, talvez esse seja um argumento complexo demais, então, tá, a prova de que Deus tem senso de humor é, como diz um filme aí, os ornitorrincos. Ora, pra que um bicho tão esquisito se não para deleite próprio?

Bom, você deve estar pensando sobre isso, não é coisa muito comum achar por aí camelos dando sopa, quanto mais virgens dispostas a terem uma relação com ele, mas, vá lá, pra salvar o mundo do apocalipse, não deve ser tão complicado assim botar a arma na cabeça de uma virgem e largar um camelo de circo pra fazer o serviço, certo?

Pois é, tá aí o problema, não é tão complicado, mas o mais importante é que não foi feito.

A culpa é desta conversa que segue:

- Bom, e então? - Disse o editor para Zebediah.
- Bom, e então o quê? - Retrucou Zebediah para o diretor com os olhos esbugalhados de tensão.
- Bom, e então, o que você quer que eu faça com isso, filho?
- Ah, quero que publique, é claro.
- Sabe, filho - o editor perscrutou as páginas do manuscrito atrás do nome que ali continha - Zebediah, Zebediah Noirton, o caso é: você sabe quantos autores apocalípticos há por aí?
- Bem...
- Milhares, milhares! Todos eles sabem tudo sobre o apocalipse, a fuga geral dos ciganos, os séculos de Nostradamus, tudo isso, tudo isso - o editor disse tudo isso fazendo gestos teatrais e olhando para o horizonte, até que subitamente ele parou e olhou direto para os olhos de Zebediah ao dizer - mas quantos vendem realmente? Nenhum, porque ninguém quer saber de fim do mundo, as pessoas querem é saber o que comer no jantar.
- Mas se este livro não for publicado, as pessoas morreram.O apocalipse, sabe?
- Ah, sei, sei, claro que sei, o caso é esse: se eu publicá-lo, vou falir a editora. E não queremos isso, queremos? Uh, uh?
- Bem...
- Não, não queremos.
- Mas e o apocalipse?
- Ora, filho, deixa disso. Vamos fazer um trato, quando esse tal apocalipse começar, você volta aqui e nós penamos em te publicar.
- Mas...
- Nada de “mas”, vamos andando, filho, tenho muitos manuscritos a rejeitar.

Zebediah era obstinado, portanto, passou em mais de 20 editoras. Mas, por incrível que pareça, a melhor e mais duradoura conversa ainda foi a de cima.

Então, o livro de Zebediah não foi publicado - portanto, ninguém poderia saber como seria o apocalipse e, principalmente, como evitá-lo.

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Dois anos depois, Zebediah foi pego tentando fazer com que uma lhama peruana (foi o mais próximo que conseguiu de um camelo) copulasse com uma menina de 11 anos.

Acabou preso.

E na prisão, tentou copular com um cachorro. Mas acabou que o cachorro mordeu a bunda dele e saiu correndo.

E o apocalipse aconteceu, enquanto Zebediah olhava pelas grades o mundo lá fora, sendo devastado por quatro caras muito descolados e com nomes divertidos como Peste, Fome, Guerra e Morte (na verdade quem fazia todo trabalho era a Morte, os outros sujeitos só barbarizam e gritavam frases sem sentido enquanto tomavam Jack Daniel´s direto da garrafa).

E foi o fim.

Ou melhor, e este é o fim.