abril 17, 2007

Ângela

Ah, Ângela. Ângela, ângela, angel. Um anjo no primeiro encontro. Uma coceira incomoda no sexto (assim como escrever “Ângela”, esse acento no início junto com a caixa alta é um saco). Um vômito de mendigo bêbado sobre meu colo no décimo segundo. Uma colisão de um caminhão desgovernado cheio de dinamite, nitroglicerina e ácido sulfúrico contra as minhas bolas depois do vigésimo. ÂNGELA.

Ela não era muito alta, não era magra, mas não era gorda também, sabe aquela coisa meio termo? Pois é, esse era Ângela o peso, meio termo, médio. O cabelo muito, muito, muito liso e preto como petróleo. Tinha cara de chinesa - ou seria vietnamita? - não sei, na real, era de família oriental. Era bonitona a mulher, porque Ângela era de fato uma mulher. Tinha uns 5 ou 6 anos a mais que eu cronologicamente, mas minha idade era a mesma dela mentalmente. Não sei dizer se eu era velho àquela época ou era ela a criança, pouco importa, o negócio é que Ângela conquistou meu coração como poucas. Aquela coisa avassaladora, logo nós dois estávamos dormindo juntos e trocando juras de amor ao acordar. Caso sério.

Conheci-a em um parque de diversões. Eu sei, clichê romântico de budget film hollywoodiano, mas não é bem por aí, o caso é que a conheci porque foi ela que me salvou de um palhaço assassino que me seqüestrara. Certamente você sabe que eu tenho muito medo de palhaços, afinal, fora o fato de serem uns palhaços, todos eles tem um olhar maligno e demente. Estava passando pelas imediações do parque de diversões e lá estava o maldito palhaço. Ele me cumprimentou com uma flor que esguichava água. Cumprimentei de volta com um pedaço de madeira que havia no chão. Nuncou soube brincar, me acusavam. Ângela foi quem me acalmou, fez eu abaixar o pau e, bem, na real, levantar o pau depois, em particular.

Tivemos nossos momentos. O sexo era selvagem e a coitada às vezes reclamava que doía - era curta, eu acho. Não, não sou eu que sou grande não, eu vejo filme pornô e sei que aquilo é grande, não isso aqui. Mas não me deixe desviar do assunto, o sexo era muito bom e nos dávamos bem. Íamos ao parque pela manhã, ao cinema à tarde, aos bares à noite. Era uma companhia perfeita, falávamos sobre tudo horas a fio. Ela tinha o maior jeitão de ser a mulher perfeita da minha vida.

Até que os problemas começaram.

Depois de um tempo (curto) em que ficamos íntimos, toda vez que ela me encontrava - ao vivo, no telefone, no messenger, por e-mail, ICQ, skype ou carta (nem vou contar aquela vez com o telefone de lata) - antes de qualquer coisa, antes de dizer “oi” até, me largava uma reclamação sobre a vida. É compreensível que isso pudesse ocorrer durante o período típico de psicopatia das mulheres, mas não sempre. Também é compreensível que se reclame de coisas que eu tenho contato, mas não de pessoas que eu sequer tinha ouvido falar antes, de modo que era extremamente comum diálogos assim:

- Oi, puta que pariu (ah, ela falava uma cacetada de palavrão), odeio o Epaminondas. Ele não sabe mais o que fazer para encher o saco?
- Quem?
- Epaminondas.
- Quem é Epaminondas?
- Meu professor de Energia Nuclear 15.
- Ah.
- Ele fez... - E aí seguia um monólogo de 340 minutos sobre reclamações que absolutamente não me interessavam. Eu realmente não precisava saber se o professor tinha dado um trabalho de 15 páginas pra daqui a 2 dias sobre energias alternativas malucas que eu sequer sabia o que significavam, nem tampouco aquelas 12 termos da tabela periódica ou de uma embalagem de xampu. Eu realmente não precisava. REALMENTE.

No início era só levemente incômodo, talvez por conta da paixão, mas o caso é que o troço passou a proporções absurdas. Eu não falava mais nada, só ouvia reclamações. Cada vez que via que era ela ligando batia uma depressão. Mas o sexo ainda era bom.

Então eu agüentava firme.

Até o dia em que nem firme conseguia mais ficar, brochei 5 vezes seguidas. Nunca mais saímos. Ela se casou logo depois com um psicólogo.

Hoje recebi a notícia que o psicólogo se matou.