Estava eu na casa do Zé num de seus famosos aniversários quando vi ela entrando. Absolutamente provocante, sem sequer fazer esforço pra isso. Tinha cabelo chanel ruivo, pele bem branquinha, boca carnuda, olhos azuis, ostentava decote generoso e uma cinturinha ótima pra botar a mão. Deixei ela se inteirar um pouco das pessoas na festa e, claro, beber um pouquinho até me aproximar.
- Oi? - disse, meio espontaneamente, quase que por cortesia, quando fingia passar por entre ela e uma outra guria.
- Oi, Dinho! - disse ela dando um enorme abraço como se me conhecesse de anos. - nossa, a quanto tempo não te vejo!
Eu não fazia idéia do que ela estava falando.
Nessas horas a gente sempre pensa “merda, qual o nome dela? De onde a conheço?” e, o mais importante, “será que já comi?” Graças a deus a amiga dela disse “Maribel, vou ali pegar uma ceva, fica aí conversando”. A notícia boa é que eu já tinha um nome, a notícia má era que eu continuava sem ter a menor idéia de onde era essa tal Maribel.
Graças a habilidade de falar sem parar dela, a conversa foi fluindo, o que foi ótimo para mim que só precisava rir, dizer que sim, fazer um comentário genérico como “que momento heim?” e tentar desvendar de onde diabos nós nos conhecíamos. Comecei a juntar o quebra-cabeças quando ela falou de alguns amigos que eu não via há uns bons 6 ou 7 anos e aí eu lembrei de tudo, quer dizer, pelo menos lembrei quem Maribel era.
Conheci Maribel numa das épocas mais esquisitas da minha vida - no meio daquele estranhíssimo abismo entre a adolescência e a vida adulta. O que podemos concluir daí, tendo eu nascido há algum tempo, é que estava começando a me divertir com as pequenas não sérias de maneira mais séria ainda que não séria. Sacou? Sim, sim, estou falando do bom e velho vai-e-vem, beijo, te ligo ano que vem. Se você é um adolescente hoje, não se espante, na minha época as menininhas não deixavam a gente visitar a Chechênia tão facilmente. Acredite. Houve uma época em que tu tinha que realmente ralar pra isso - até mesmo com tua namoradinha. Desta forma, quando você se dava bem numa festa, não significava exatamente que iria MESMO se dar bem.
E esse foi o caso com ela, dei uns beijinhos numa rave (eu disse que era uma fase estranha da minha vida), mas não passou disso. Primeiro porque ela era uma menininha ainda, segundo que era lésbica. Sapatona mesmo, dessas que até beija homem quando tá meio bêbada, mas dar? Há! Nem pensar, magrão.
Quando a amiguinha dela voltou com duas cervejas, entendi que eu estava sobrando. “Ok, eu estou aqui passando cantadas numa lésbica, provavelmente aquela ali da cerveja é a namorada e em breve eu vou estar apanhando de duas mulheres, ora de partir pra outra”. Certamente tu sabes que eu sou um sujeito bastante resignado. Não tento nada com muito afinco, se não rolar, não forço.
Se você já foi em festas na casa de alguém (ou viu algumas comédias adolescentes de Róliudi) sabe que em determinado momento rola o famoso “salve-se quem puder”, onde metade da festa está se beijando e tirando a roupa em cantos obscuros do lugar e a outra metade está indo embora porque suas namoradas não podem ver aquilo. Eu infelizmente não estava incluso nem no primeiro grupo, muito menos no segundo, de modo que me sobrou apenas beber até morrer (nunca fui lá muito galanteador, quando fico bêbado eu fico anti-social).
Estava eu indo em direção ao banheiro quando ouvi uns gemidos muito delícia. Bêbado que estava, decidi averiguar o mistério (ou, como diria o Chaves, “a very güei mister yo”). Com um pequeno empurrão abri totalmente a porta que estava entreaberta e encontrei Maribel e sua amiguinha, ambas deitadas na cama, a amiga por cima, ambas vestidas, mas rolando aquele amasso delícia. Fui fechando a porta, resignando-me a ser xingado por ter aberto quando de repente Maribel disse “Dinho, vem cá um pouquinho”.
Com certeza não foi isso que me passou pela cabeça, mas podemos traduzir com um simples “Obrigado, Senhor”.
Me deitei junto delas e beijava uma e outra. Tentamos até um beijo triplo, mas isso é o tipo de coisa que só faz a galera encostar as bochechas umas nas outras enquanto sacode a língua pra lá e pra cá. Na real nem rolou nada além disso, só uns beijinhos, uma mão aqui, outra ali. Mas foi bastante divertido.
Depois daquela festa Maribel brigou com essa menina que era uma espécie de namorada, diz ela que a guria reclamou da minha presença, quando ficou sóbria. Não sei ao certo, só sei que passamos a nos ver como bons amigos. Bebíamos pra caralho juntos, íamos a praia juntos e, claro, transávamos. O sexo era bom, não me entenda mal, mas tinha uma coisa estranha. Maribel de jeito NENHUM me deixava chupá-la. Nunca perguntei a ela, mas imagino eu que a coisa seja simples: mulheres devem saber fazer isso bem melhor que homens, já que entendem totalmente a lógica da coisa por possuírem o equipamento.
Na verdade essa não era a única coisa estranha de sair com Maribel. Por força do hábito, imagino, ela me tratava às vezes como se fosse uma mulher. Não estou falando de dedo no rabo, não, sai pra lá! Mas tipo assim, quando íamos em um restaurante, ela enchia o saco até pagar a conta. Não estou falando em dividir a conta, tão popular nesses pouco galanteadores anos 2000, estou falando de pagar toda a conta. E isso se repetia sempre no cinema, no motel, nos bares. Talvez ela sentisse que fosse responsabilidade dela, nunca entendi.
Outro troço interessante de sair com Maribel é que ficávamos falando de mulher - as mais gostosas, as que mais sabiam dar, as mais fracassadas, enfim. Era só passar uma gostosa que comentávamos. Isso tudo era realmente perturbador. Tão perturbador que às vezes eu é que me sentia gay de estar saindo com ela. Pense bem: tomar cerveja e falar de mulher, eu estava praticamente saindo com um de meus amigos. A única questão é que ele tinha peitos e, obrigado senhor mais uma vez, não tinha pau.
Só que nunca esqueci que Maribel era mulher e, como mulher, era suscetível a todo tipo de ataque frenético sem motivo aparente. Nessas horas ela era realmente uma mulherzinha. Gritava, ficava brava, fumava e então fazíamos as pazes transando enlouquecidamente, aí era quando ela revelava seu lado mais fêmea - gostava de ser dominada, xingada, essas coisas.
Num desses ataques, ela já estava sem blusa na minha cama quando disse que não iria transar comigo. Acostumado com suas mulherzices, desencanei - como já disse, não sou muito de ficar tentando as coisas. Fui levar ela até em casa, mas ela pediu para que passássemos em um barzinho qualquer, para beber uma ou duas cevas. Eu disse que não tinha dinheiro. Ela obviamente disse que pagaria tudo, era o jeito dela fazer as coisas e eu concordei. No fundo, eu gostava muito de ficar ao lado dela, um amigo mulher que transava, o que mais eu poderia querer? Sentados no bar, ela começa:
- Dinho, eu gosto muito de ti.
- Eu também, cara. - bebi minha cerveja, olhando em volta.
- Dinho, tu não tá entendendo. Eu não quero ser só tua fodinha.
- Mas tu não é, porra!
- Não? - Os olhos dela brilharam.
- Claro que não, tu é minha amiga.
Palavras erradas na hora errada. Ah, depois que eu disse essa última frase a cara dela e o tempo fechou pra mim. Maribel acendeu seu cigarro. Estava a caminho um dos ataques histéricos, eu tinha certeza. Ela pegou o copo de cerveja e jogou o conteúdo em mim. Não chegou a pegar na minha cara, mas minha camiseta ficou toda molhada de cerveja.
- Tu é um idiota mesmo, Dinho. Tu não vê que eu não quero ser tua amiga?
Essa foi a vez dela dizer as palavras erradas. Jamais mencione, mesmo de leve, “namoro” para um homem que não está esperando por isso. Finalmente eu tinha entendido, ela gostava de mim mais do que eu dela. Eu só queria uma amiga que transava, ela queria amor.
- Mas... mas... mas... tu não gosta de mulher?
Ela urrou de raiva, levantou-se e foi embora a pé - não sem antes pagar a conta.
Nunca mais nos vimos. Uma pena.