fevereiro 25, 2007

O Segundo Círculo do Poder

Não sei o quanto tu conhece do que Carlos Castaneda escreveu, mas muito provavelmente deve orbitar entre fumetagem da braba e indiaria shamanística. Bom, pode até ter um quê de verdade nisso, mas não é nem de perto como eu vejo a obra de Castaneda. Dizer que os vários livros que ele escreveu sobre sua experiência com o feiticeiro Dom Juan é sobre “plantas do poder” (entenda aí por "alucinógenas") é mais ou menos como dizer que Clube da Luta é um filme sobre caras que lutam entre si.

No Segundo Círculo do Poder, se não me engano o 5o livro da série que começou com “Os Ensinamentos de Dom Juan” (traduzido aqui no Brasil, provavelmente por um maconheiro das letras, como “A Erva do Diabo”), continua a tendência de deixar as plantas do poder totalmente de lado e entrar numa viagem muito mais mística. Ainda que o peiote seja mencionado, é apenas no passado, para contextualizar o leitor, agora Castaneda está muito mais próximo de conseguir controlar sua 2a atenção, de modo que não precisa mais das plantas. Este é o primeiro livro depois que Castaneda completou seu treinamento com Dom Juan Matus, pulando do abismo do tonal para o nagual.

A mim parece que a cada livro ele evolui, não como escritor, mas sim como guerreiro, por isso pode haver coisas contraditórias ou percebidas de maneiras diversas a medida que foi escrevendo suas experiências. Portanto, nos dois primeiros livros parecia ser sobre o uso do viagem de peiote, depois sobre os aliados e agora sobre como ser um guerreiro impecável para ver no lugar de apenas olhar. Parece sensato, nem Castaneda sabia o caminho que estava trilhando, por isso a confusão. Castaneda estava deixando de ser o estúpido pesquisador racional e começando a entender de verdade as coisas, não colocando-as em sistemas de regras próprias do tonal (o mundo ordinário), mas sim da maneira do nagual (o mundo não-ordinário).

Alguns consideram essa série como 100% fábula, outros como um relato de alguém que realmente estava trilhando o caminho do guerreiro para tornar-se impecável, se é lá ou cá, não posso saber, assim como ninguém sabe ao certo onde nasceu Castaneda, cujos registros apontam para o Peru, enquanto ele mesmo falou que foi no Brasil. Nem mesmo há um consenso sobre o nome dele, que podia ser tanto Castañeda, como Castaneda ou nada disso, já que ele mesmo disse que havia inventado o nome. Acredito que estas coisas sejam indícios de que ele realmente estava tentando apagar sua história pessoal, portato tendo passado pelo que descreveu nos livros, inserindo obviamente momentos de ficção para tornar a narrativa mais interessante, trocando nomes, fundindo diversas pessoas em um único personagem, etc, mas em suma, acredito mesmo que o sujeito passou pela experiência de se tornar um guerreiro, procurando perder sua forma humana para tornar-se apenas nagual.

Eu gosto dos livros dele, mas também não preciso levá-los ao pé da letra (ainda que, no passado, confesso ter sido bem sucedido na experiência de olhar para as mãos no sonho e controlá-lo). Recomendo, mas só se você não tiver muitos julgamentos a fazer. Sobre certas coisas, não adianta “racionalizar”, elas não têm explicação, apenas “são”, como parece que Castaneda finalmente descobriu ao final d’O Segundo Círculo do Poder.